“As pessoas não são perturbadas pelas coisas, mas pelo modo que as veem”. Epicteto
Ouvindo uma mensagem negativa: 4 opções
Segundo Marshall, o que os outros
fazem pode ser estímulo para nossos sentimentos, mas não a causa.
No terceiro componente da CNV, reconhecemos e tomamos consciência da raiz
desses sentimentos. Esse componente tem grande potencial transformador, nos
traz autonomia e é muito importante.
Quando alguém nos envia uma mensagem
negativa, seja verbal ou não, podemos receber de 4 maneiras.
Se alguém, com raiva, diz, por
exemplo: “Você é a pessoa mais irresponsável que eu já vi”.
Podemos receber:
1. Culpando a nós mesmos
·
“Ah eu deveria ser
mais cuidadoso”.
Aceitamos o julgamento pagando um
preço caro, as custas de nossa autoestima.
2. Culpando os outros
·
“Você não tem o
direito de dizer isso, estou sempre me esforçando por aqui”.
·
“Mas olha só quem
está falando”.
Esse é um caminho que comumente traz
um sentimento de raiva.
3. Escutar nossos próprios sentimentos
·
“Quando escuto você
dizer que sou a pessoa mais irresponsável, fico magoado, porque preciso de
algum reconhecimento de meus esforços em cuidar das coisas”.
Ao focarmos a atenção em nossos
próprios sentimentos e necessidades, nos conscientizamos de que nosso atual
sentimento de mágoa deriva da necessidade de que nossos esforços sejam
reconhecidos
4. Escutar os sentimentos e necessidades dos outros.
·
"Você está
magoado porque precisa de mais zelo ao seu redor”?
Virar o foco para os sentimentos e
necessidades da outra pessoa, tais como expressos naquele momento e, assim,
encontrar conexão.
As duas últimas são mais interessantes. |
Aceitamos a responsabilidade, em vez
de culpar outras pessoas por nossos sentimentos, ao reconhecermos nossas
próprias necessidades, desejos, expectativas, valores ou pensamentos. Observe a
diferença entre as seguintes expressões de desapontamento:
EXEMPLO 1
A: "Você me desapontou ao não
aparecer na noite passada."
B: "Fiquei desapontado quando
você não apareceu, porque eu queria conversar a respeito de algumas coisas que
estavam me incomodando."
Na frase A, a pessoa atribui a
responsabilidade pelo desapontamento somente à atitude da outra pessoa. Em B, o
sentimento de desapontamento é reconhecido no desejo da própria pessoa que
fala, o qual não está sendo atendido
EXEMPLO 2
A: "Fiquei realmente irritado
por eles terem cancelado o contrato."
B: "Quando eles cancelaram o
contrato, senti-me realmente irritado, porque fiquei pensando que aquilo tinha
sido de uma irresponsabilidade absurda."
Na frase A, a pessoa atribui sua
irritação exclusivamente ao comportamento da outra pessoa, ao passo que, na
frase B, ela aceita a responsabilidade por seus sentimentos, ao reconhecer o
pensamento por trás deles. Ela reconhece que seu modo recriminatório de pensar
havia gerado sua irritação.
Entretanto, a CNV encoraja a pessoa a
ir além, identificando o que ela está querendo, qual desejo, expectativa ou
necessidade não foi atendida? Quanto mais formos capazes de relacionar
nossos sentimentos às nossas próprias necessidades, mais fácil será para os
outros reagir compassivamente. Para relacionar seus sentimentos ao que ela
estava querendo, a pessoa da frase B poderia ter dito:
"Quando eles cancelaram o contrato, fiquei realmente irritado, porque eu tinha esperanças de recontratar os empregados que dispensamos no ano passado".
Fazer distinção entre doar de coração e ser motivado pela culpa
Atribuir o sentimento a outras
pessoas é criar motivação pela culpa. Dizer: “mamãe fica triste quando você
vai mal na escola”, significa inferir que a criança é a causa da felicidade
da mãe. Isso pode ser confundido com preocupação positiva: parece que a criança
se preocupa e se sente mal de ver a mãe sofrer, mas na verdade ela age, se
agir, para evitar culpa.
Alguns padrões de linguagem ajudam a
mascarar a responsabilidade por nossos sentimentos:
1. O uso de expressões e pronomes impessoais, como algo e isso:
·
“Algo que realmente
me enfurece é quando erros de ortografia aparecem em nossos folhetos para o
público"
·
“Isso me aborrece
muito".
2. Afirmações que somente mencionam as ações de outros:
·
“Quando você não me
liga em meu aniversário fico magoado";
·
"Mamãe fica
desapontada quando você não termina de comer”.
3. O uso da expressão "Sinto-me [uma emoção] porque" seguida de uma pessoa ou pronome pessoal que não eu.
·
“Sinto-me magoado
porque você disse que não me amava".
·
"Sinto-me
zangado porque a supervisora não cumpriu sua promessa".
--- Expressaríamos melhor, no entanto, assumindo a
responsabilidade, talvez assim:
1. "Sinto-me realmente
enfurecido quando erros de ortografia como esse aparecem em nossos folhetos
para o público por que eu quero que nossa companhia projete uma imagem
profissional.
2. "Mamãe fica desapontada
quando você não termina de comer, porque eu quero que você cresça forte
e saudável"
3. Sinto-me zangado por a supervisora não ter cumprido
sua promessa, porque eu contava com aquele fim de semana para visitar
meu irmão".
As necessidades na raiz dos
julgamentos
Como já vimos, julgamentos, críticas,
diagnósticos e interpretações dos outros são todas expressões alienadas e
trágicas de nossas necessidades.
Quando uma esposa diz: "Você
tem trabalhado até tarde todos os dias desta semana; você ama o trabalho mais
do que a mim", ela está dizendo que sua necessidade de contato íntimo
não está sendo atendida.
Quando expressamos nossas
necessidades indiretamente, através do uso de avaliações, interpretações e
imagens, é provável que os outros escutem nisso uma crítica e, por isso, tendem
a investir sua energia na autodefesa ou no contra-ataque.
Se desejamos obter uma reação
compassiva dos outros, expressar nossas necessidades interpretando ou
diagnosticando o comportamento deles é jogar contra nós mesmos. Em vez
disso, quanto mais diretamente conseguirmos conectar nossos sentimentos a
nossas próprias necessidades, mais fácil será para os outros reagirem a
estas com compaixão.
Infelizmente, a maioria de nós nunca
foi ensinada a pensar em termos de necessidades. Estamos acostumados a pensar no que há de errado
com as outras pessoas sempre que nossas necessidades não são satisfeitas.
Assim, se desejamos que os casacos sejam pendurados no armário, por exemplo,
podemos classificar nossos filhos de preguiçosos por deixá-los sobre o sofá.
Marshall nota em sua experiência que
no momento em que as pessoas começam a conversar sobre o que precisam, em vez
de falarem do que está errado com as outras, a possibilidade de encontrar
maneiras de atender às necessidades de todos aumenta enormemente.
Eis algumas necessidades humanas
universais:
Necessidades que todos nós compartilhamos. |
A dor de expressarmos nossas necessidades versus A dor de não as expressarmos.
Se não valorizarmos nossas
necessidades, os outros também podem não valorizá-Ias.
Num mundo onde somos frequentemente
julgados severamente por identificarmos e revelarmos nossas necessidades, fazer
isso pode ser bastante assustador.
As mulheres, em especial, estão
sujeitas a críticas. Durante séculos, a imagem da mulher amorosa tem sido
associada ao sacrifício e à negação de suas próprias necessidades, com o
objetivo de cuidar dos outros. Devido ao fato de as mulheres serem socialmente
ensinadas a considerar o cuidado com os outros como sua maior obrigação, elas
muitas vezes aprenderam a ignorar as próprias necessidades.
Por ter medo de pedir o que precisa,
uma mulher pode simplesmente deixar de dizer que ela teve um dia cheio, está
cansada e gostaria de ter algum tempo à noite para si mesma; em vez disso, suas
palavras saem como se fossem uma causa judicial: "Você sabe, não tive um
momento para mim mesma o dia todo. Passei todas as camisas, lavei as roupas da
semana toda, levei o cachorro ao veterinário, fiz o jantar, fiz a marmita do
almoço e liguei para todos os vizinhos para avisar da reunião do bairro, então [implorando]
... que tal se você ... ?
Um pedido que reforça a crença de que
elas não têm nenhum direito legítimo a suas necessidades e de que estas não são
importantes.
Amo, logo nego minhas necessidades. |
"Não!", vem a resposta. O melancólico pedido provoca
resistência de seus ouvintes, em vez de compaixão. Argumentar de um lugar em
que ela “deveria” ou “mereceria” gera dificuldade em se ouvir e
valorizar necessidades por trás dos pedidos.
No final, a mulher é novamente
persuadida de que suas necessidades não importam, sem perceber que elas foram
expressas de tal maneira que seria improvável obter uma reação favorável.
Da escravidão à libertação emocional.
No desenvolvimento em direção a um
estado de libertação emocional, a maioria de nós parece passar, nos diz
Marshall, por três estágios na maneira como nos relacionamos com os outros:
Estágio 1 - Escravidão emocional: vemos a nós mesmos como responsáveis pelos sentimentos dos outros.
Acreditamos que somos responsáveis
pelos sentimentos dos outros. Achamos que devemos nos esforçar constantemente
para manter todos felizes. Se eles não parecem felizes, sentimo-nos responsáveis
e compelidos a fazer alguma coisa a respeito. Isso pode facilmente nos
levar a ver as próprias pessoas que são mais próximas de nós como fardos.
Estágio 2 – Ranzinza: sentimos raiva, não queremos mais ser responsáveis pelos sentimentos dos outros.
Nessa fase, tomamos consciência do
alto custo de assumir a responsabilidade pelos sentimentos dos outros e por
tentar satisfazê-los em detrimento de nós mesmos. Quando percebemos quanto de
nossa vida perdemos e quão pouco respondemos ao chamado de nossa própria alma,
podemos ficar com raiva.
Às vezes reagimos e queremos ignorar
totalmente tudo o que não seja nosso. Chutamos o balde. O que pode gerar
sofrimento também, mas já é um passo adiante em relação a escravidão emocional.
Estágio 3 – Libertação emocional: assumimos a responsabilidade por nossas intenções e ações.
Na terceira etapa, a libertação
emocional, respondemos às necessidades dos outros por compaixão, nunca por
medo, culpa ou vergonha.
Aceitamos total responsabilidade por
nossas intenções e ações, mas não pelos sentimentos dos outros. Nesse estágio,
temos consciência de que nunca poderemos satisfazer nossas próprias
necessidades à custa dos outros.
A libertação emocional envolve
afirmar claramente o que necessitamos, de uma maneira que deixe óbvio que
estamos igualmente empenhados em que as necessidades dos outros sejam
satisfeitas.
Isso é CNV.
Exercício - Reconhecendo necessidades
Para praticar a identificação de
necessidades, faça um círculo ao redor do número (ou memorize) em frente de
todas as afirmações abaixo em que a pessoa estiver assumindo a responsabilidade
por seus sentimentos.
- Você me irrita quando deixa documentos da empresa no chão da sala de conferências.
- Fico com raiva quando você diz isso, porque quero respeito e ouço suas palavras como um insulto.
- Sinto-me frustrada quando você chega atrasado.
- Estou triste por você não vir para jantar, porque eu estava esperando que pudéssemos passar a noite juntos.
- Estou desapontado porque você disse que faria aquilo e não o fez.
- Estou desmotivado porque gostaria de já ter progredido mais em meu trabalho.
- As pequenas coisas que as pessoas dizem às vezes me magoam.
- Sinto-me feliz porque você recebeu aquele prêmio.
- Fico com medo quando você levanta a voz.
- Estou grato por você ter me oferecido uma carona, porque eu precisava chegar em casa antes das crianças.
.
.
....
Respostas de Marshall Rosenberg para o exercício.
1. Se você circulou esse número,
discordamos. Para mim, essa afirmação implica que o comportamento da outra
pessoa é exclusivamente responsável pelos sentimentos de quem falou. Ela não
revela as necessidades ou pensamentos que estão contribuindo para os
sentimentos dessa pessoa. Para tanto, a pessoa poderia ter dito: "Fico
irritado quando você deixa documentos da companhia no chão da sala de
conferências, porque quero que nossos documentos sejam guardados em segurança e
fiquem acessíveis':
2. Se você circulou esse número, concordamos
em que a pessoa está assumindo a responsabilidade por seus sentimentos.
3. Se você circulou esse número,
discordamos. Para expressar as necessidades ou ensamentos subjacentes a seus
sentimentos, a pessoa poderia ter dito: "Sinto-me frustrada quando você
chega atrasado, porque eu esperava que conseguíssemos poltronas na primeira
fila”.
4 Se você circulou esse número,
concordamos em que a pessoa está assumindo a responsabilidade por seus
sentimentos.
5. Se você circulou esse número,
discordamos. Para expressar as necessidades ou pensamentos subjacentes a seus
sentimentos, a pessoa poderia ter dito: "Quando você disse que faria
aquilo e depois não o fez, fiquei desapontada, porque eu gostaria de poder confiar
em sua palavra':
6.
Se você circulou esse número, concordamos em que a pessoa está assumindo a
responsabilidade por seus sentimentos.
7. Se você circulou esse número,
discordamos. Para expressar as necessidades ou pensamentos subjacentes a seus
sentimentos, a pessoa poderia er dito."Às vezes quando as pessoas dizem
algumas coisinhas, fico magoado, porque ser valorizado, não criticado”.
8.Se você circulou esse número,
discordamos. Para expressar as necessidades e pensamentos subjacentes a seus
sentimentos, a pessoa poderia ter dito'. "Quando você recebeu aquele
prêmio, fiquei feliz, porque eu esperava que você fosse reconhecido por todo o
trabalho que dedicou àquele projeto”.
9. Se você circulou esse número,
discordamos. Para expressar as necessidades e pensamentos subjacentes a seus
sentimentos, a pessoa poderia ter dito. "Quando você levanta sua voz, fico
com medo, porque digo para mim mesma que alguém pode se ferir aqui, e preciso
ter a certeza de que todos estamos seguros”
10.
Se você circulou esse número, concordamos em que a pessoa está assumindo a
responsabilidade por seus sentimentos.
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