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Quando as pessoas confiam que o nosso compromisso maior é com a qualidade do relacionamento e que nossa expectativa é usar o processo para atender a necessidade de todos, então elas podem confiar que fazemos verdadeiros pedidos, e não exigências camufladas
Fazer um pedido – não uma exigência –
de maneira clara e específica é o último dos quatros componentes da CNV. Nesse capítulo estudaremos como podemos expressar
nossos pedidos de modo que os outros estejam mais dispostos a responder
compassivamente a nossas necessidades.
Usando uma linguagem de ações positivas.
Em primeiro lugar, é preciso que
saibamos expressar o que de fato estamos pedindo e não o que não estamos
pedindo.
Ruth Bebermeyer levanta a questão em
uma de sua canções:
Como é que você faz um “não faça”? Tudo que sei é que sinto “Não vou”.
Quando a gente pede um “não fazer”,
as pessoas ficam confusas quanto ao que realmente está sendo pedido. Além
disso, a solicitação negativa pode provocar resistência em seu ouvinte.
“Num seminário, uma mulher, frustrada
porque o marido estava passando tempo demais no trabalho, descreveu como seu
pedido tinha se voltado contra ela: ‘Pedi que ele não passasse tanto tempo
no trabalho. Três semanas depois, ele reagiu anunciando que havia se inscrito
num torneio de golfe!’. Ela havia comunicado a ele com sucesso o que ela
não queria – que ele passasse tanto tempo no trabalho -, mas tinha deixado de
pedir o que ela realmente queria. Solicitada a reformular seu pedido, ela
pensou por um minuto e disse: ‘Eu queria ter-lhe dito que desejava que ele
passasse pelo menos uma noite por semana em casa com as crianças e comigo’.”
Além de utilizarmos uma linguagem
positiva, devemos evitar frases vagas, abstratas ou ambíguas e formular nossas
solicitações na forma de ações concretas que os outros possam realizar.
Lassie! Vá buscar ajuda!! |
No quadrinho acima, a cadela
interpretou o vá pedir ajuda como procurar psicanálise, mas é provável que o
homem se afogando estivesse se referindo a outro tipo de ajuda.
Marshall ilustra:
Um pai e o filho de 15 anos vieram se
aconselhar comigo. "Tudo o que quero é que você comece a demonstrar um
pouco de responsabilidade", alegou o pai. "É pedir demais?"
Sugeri que especificasse o que o filho precisaria fazer para demonstrar a
responsabilidade que ele queria. Depois de uma discussão sobre como tornar mais
clara sua solicitação, o pai respondeu envergonhado: "Bem, isso não soa
muito bem, mas quando digo que quero responsabilidade, o que quero mesmo dizer
é que desejo que ele faça o que eu digo sem questionar – que pule quando eu
disser para pular, e que faça isso sorrindo". Ele então concordou
comigo que, se o filho se comportasse daquela maneira, estaria demonstrando
obediência, e não responsabilidade.
Assim como esse pai, muitas vezes
usamos uma linguagem vaga e abstrata para indicar como queremos que as outras pessoas
se sintam ou sejam, sem especificar uma ação
concreta que os outros possam fazer para
alcançar aquele estado. Nesse sentido, a linguagem vaga e abstrata pode
mascarar um jogo interpessoal de opressão.
Fazendo pedidos conscientemente.
Às vezes a gente expressa um
desconforto e espera erroneamente que o ouvinte compreenda o pedido que está
embutido. Por exemplo, uma mulher poderia dizer ao marido: "Estou aborrecida porque você se esqueceu de
comprar a cebola que pedi para o jantar”. Embora
pareça óbvio para ela um pedido para voltar à loja, o marido pode pensar suas
palavras foram ditas apenas para que ele se sentisse culpado.
Igualmente problemática é a situação
oposta: quando as pessoas fazem seus pedidos sem primeiro comunicar os
sentimentos e necessidades por trás deles.
Isso é especialmente verdadeiro
quando o pedido assume a forma de uma pergunta: "Por que você não vai
cortar o cabelo?"
Essa pergunta pode facilmente ser
entendida pelos jovens como uma exigência ou um ataque, a menos que os pais se
lembrem de primeiro revelar seus próprios sentimentos e necessidades: "Estamos
preocupados, porque seu cabelo está ficando tão comprido que pode impedir você
de ver as coisas, especialmente quando está em sua bicicleta. Que tal
cortá-lo?"
Quanto mais claros formos a respeito do que queremos obter, mais provável será que o consigamos.
Entretanto, é mais comum que as
pessoas conversem sem estar conscientes do que estão pedindo. As pessoas podem
dizer que não estão pedindo nada, no entanto, Marshall nos diz que sempre que
dizemos algo a alguém, estamos pedindo algo em troca.
Pode ser simplesmente uma conexão de
empatia - um reconhecimento verbal ou não-verbal de que nossas palavras foram
compreendidas. Ou podemos estar pedindo honestidade: saber qual é a reação
honesta do ouvinte a nossas palavras. Ou ainda podemos estar pedindo uma ação
que satisfaça a nossas necessidades. Quanto mais claros formos a respeito do
que queremos da outra pessoa, mais
provável será que nossas necessidades sejam atendidas.
Pedindo um retorno.
A mensagem que enviamos nem sempre é a mensagem que é recebida.
Geralmente dependemos de pistas
verbais para determinar se nossa mensagem foi compreendida da maneira que
queríamos. Mas, se não temos certeza de que foi recebida como pretendíamos,
podemos solicitar claramente uma resposta que nos diga como a mensagem foi
ouvida, a fim de evitar qualquer mal-entendido.
Em algumas ocasiões, apenas um “está claro?” é
suficiente. Em outras, precisamos do que um “Sim,
entendi” para estarmos seguros de que a
mensagem foi recebida. Aqui, podemos pedir ao outro que repetia com suas
palavras o que acabara de ouvir. Temos então uma oportunidade de reformular
partes de nossa mensagem de modo que resolva qualquer discrepância que possamos
ter notado no retorno que recebemos.
Pode ser que, num primeiro momento,
isso soe estranho. Pode ser que o outro interprete como uma afronta a sua
capacidade auditiva ou interpretativa. Quando isso acontecer, podemos nos
utilizar da CNV mais uma vez para mostrar o quanto é importante é para nós ter
a confiança de que conseguimos emitir realmente a sutileza da mensagem.
Pedindo honestidade.
Quando nos expressamos abertamente e
vulnerável, e recebemos a compreensão que desejávamos, é comum que fiquemos
ansiosos para saber qual a reação da outra pessoa ao que dissemos. Geralmente,
esperamos a honestidade em algum desses três caminhos:
Queremos saber qual sentimento foi
estimulado pelo que foi dito. O que poderia ser perguntando: “Gostaria que você me dissesse como se sente a
respeito do que acabei de falar e suas razões para sentir-se assim”
Queremos saber qual a opinião do
interlocutor em relação ao que foi dito. Nesse caso é importante especificar o
lugar dessa opinião: "Gostaria que você me dissesse
se prevê que minha proposta terá sucesso e, caso contrário, o que você acha que
pode impedir seu sucesso",
em vez de simplesmente:
"Gostaria de saber o que acha”.
Queremos saber se o ouvinte está
disposto a tomar determinada atitude.
O que poderia ser feito da seguinte
maneira: “Gostaria de saber se você está
disposto a adiar a reunião desta semana”.
Fazendo pedido a um grupo.
Reunir-se em um grupo de discussão
nem sempre é fácil. Se o objetivo e a motivação das nossas intervenções não
estiver claro, a reunião pode facilmente se perder e criar um sentimento geral
de que estar ali é uma grande perda de tempo.
Ao contar uma história ao grupo, por
exemplo, é comum de os outros presentes também compartilharem vivências
semelhantes e a reunião se estender sem chegar a lugar algum. Basta algumas
interações improdutivas para que horas de grupo se arrastem indefinidamente e
não satisfaçam a necessidade de nenhum presente. Frustração geral e muito
comum.
A consciência do Bas.
Na Índia, quando as pessoas recebem a
resposta que desejavam em conversas que elas mesmas iniciaram, elas dizem: "Bas!"
Isso significa: "Você não precisa dizer mais nada. Estou satisfeito e
já estou pronto para passar a outro assunto". Embora não tenhamos uma
palavra como essa em nosso idioma, ainda podemos nos beneficiar de desenvolver
e promover a "consciência do bas" em todas as nossas
interações.
Pedido versus Exigência
Qual a melhor maneira de
identificarmos se estamos fazendo um pedido ou uma exigência? Se aceitamos
receber um “não” entendendo que isso é um “sim”
para alguma outra necessidade do outro, então estamos fazendo um pedido. Se não
aceitamos que ele diga não, então trata-se de uma exigência.
Como ousa me dizer não?? Exigências e suas justificações. |
Pedidos são interpretados como exigências, quando os outros acreditam que serão culpados ou punidos se não atenderem. Quando as pessoas ouvem uma exigência, elas enxergam duas opções: submissão ou rebelião.
Nos dois casos, quem fez o pedido é
visto como coercitivo e a chance de se receber um retorno compassivo é reduzido
fortemente.
“Quanto mais tivermos culpado, punido ou acusado os outros quando não atenderam a nossas solicitações no passado, maior será a probabilidade de que nossos pedidos sejam agora entendidos como exigências”.
Se José diz a Maria: “Estou me sentindo solitário, gostaria que você
saísse comigo essa noite”.
Isso seria pedido ou exigência?
"José, estou muito cansada. Se
você quer ter companhia, que tal encontrar outra pessoa para sair com você esta
noite?" Se José disser: "É tão típico de você ser assim egoísta!", então isso é uma exigência.
Quanto mais interpretarmos como
rejeição o não-atendimento de nossas solicitações, mais provável será que
nossos pedidos sejam entendidos como exigências.
Pessoas que têm uma trajetória na
qual recebem exigências a todo momento, tendem a ver os nossos pedidos da mesma
forma. Também acontece quando ocupamos alguma posição de autoridade. A maneira
mais poderosa de comunicar que o que estamos fazendo é um pedido genuíno é
oferecer nossa empatia quando as pessoas não atendem a nossa solicitação:
“Se estivermos preparados para
demonstrar uma compreensão empática do que impede que a pessoa faça o que
pedimos, então, por minha definição, fizemos um pedido, e não uma exigência”.
Definindo nosso objetivo ao fazer pedidos.
A CNV não é uma ferramenta para mudar
as pessoas e obter o que queremos.
O processo foi desenvolvido para
aqueles que querem que os outros mudem e nos atendam, mas somente se escolherem
fazer isso de livre vontade e compaixão.
O objetivo da CNV é estabelecer um relacionamento baseado na sinceridade e na empatia.
“Quando os outros confiam que nosso
compromisso maior é com a qualidade do relacionamento, e que esperamos que esse
processo satisfaça às necessidades de todos, então elas podem confiar que nossas
solicitações são verdadeiramente pedidos, e não exigências camufladas”.
É mais difícil manter isso em mente
quando ocupamos posições de autoridade, como pais, professores e chefes, e
acreditamos precisar influenciar pessoas para obter resultados comportamentais.
Também é preciso ficar atento aos
pensamentos que fazem nosso pedido automaticamente se tornar uma exigência:
- Ele deveria se arrumar sozinho.
- Espera-se que ela faça o que eu peço.
- Eu mereço um aumento.
- Tenho motivos para querer que eles fiquem até mais tarde.
- Tenho o direito de ter mais tempo de folga.
Quando formulamos nossas necessidades dessa maneira estamos fadados a julgar os outros quando eles não fazem o que pedimos.
Exercício
Será que concordamos com Marshall?
Para verificar se concordamos a respeito da clara expressão dos pedidos, circule o número em frente de qualquer uma das frases a seguir em que a pessoa esteja claramente solicitando que alguma ação especifica seja feita.
- Quero que você me compreenda.
- Gostaria que você me dissesse uma coisa que eu fiz de que você gostou.
- Gostaria que você sentisse mais confiança em si mesmo.
- Quero que você pare de beber.
- Gostaria que você me deixasse ser eu mesma.
- Gostaria que você fosse honesto comigo a respeito da reunião de ontem.
- Gostaria que você dirigisse dentro do limite de velocidade.
- Gostaria de conhecer melhor você.
- Gostaria que você demonstrasse respeito por minha privacidade.
- Gostaria que você preparasse o jantar mais vezes.
Respostas:
1. Se você circulou esse número,
discordamos. Para mim, a palavra compreenda não expressa claramente uma ação
específica que está sendo solicitada. Em vez disso, a pessoa poderia ter dito:
"Quero que você repita para mim o que
você me ouviu dizer".
2. Se você circulou esse número, concordamos em que a frase expressa claramente o que a pessoa está pedindo.
3. Se você circulou esse número, discordamos. Para mim, a expressão "sentir mais confiança" não expressa claramente uma ação específica que está sendo solicitada. A pessoa poderia ter dito: "Gostaria que você fizesse um treinamento em pensamento afirmativo, que acredito que aumentaria sua autoconfiança”.
4. Se você circulou esse número, discordamos. Para mim, a expressão "parar de beber" não expressa claramente o que a pessoa quer, e, sim, o que ela não quer. Ela poderia ter dito: "Quero que você me diga quais de suas necessidades a bebida satisfaz e que conversemos sobre outras maneiras de satisfazer essas necessidades”.
5. Se você fez um círculo em volta desse número, não concordamos. Para mim, a expressão "me deixar ser eu mesma" não expressa claramente uma ação especifica que está sendo solicitada. A pessoa poderia ter dito: "Quero que você me diga que não vai abandonar nosso relacionamento, mesmo que eu faça algumas coisas de que você não goste".
6. Se você fez um círculo ao redor desse número, discordamos. Para mim, a expressão "ser honesto comigo" não expressa claramente uma ação especifica que está sendo solicitada. A pessoa poderia ter dito: "Quero que você me diga como se sente a respeito do que eu fiz e o que gostaria que eu tivesse feito de modo diferente".
7. Se você fez um círculo em volta desse número, concordamos que a frase expressa claramente o que a pessoa está pedindo.
8. Se você fez um círculo ao redor desse número, não concordamos. Para mim, essa frase não expressa claramente uma ação específica que está sendo solicitada. A pessoa poderia ter dito: "Gostaria que você me dissesse se estaria disposto a se encontrar comigo para almoçar uma vez por semana".
9. Se você fez um círculo ao redor desse número, discordamos. Para mim, a expressão "demonstrar respeito por minha privacidade" não expressa claramente uma ação específica que está sendo solicitada. A pessoa poderia ter dito: "Gostaria que você concordasse em bater na porta antes de entrar em meu escritório”
10. Se você fez um círculo ao redor desse número, não estamos de acordo. Para mim, a expressão "mais vezes" não expressa claramente uma ação específica que está sendo solicitada. A pessoa poderia ter dito: "Gostaria que você preparasse o jantar toda segunda-feira à noite”.
Até o próximo capítulo!
Toda sua explicação sobre CNV é muito rica! Parabéns :)
ResponderExcluirmaravilhoso! mto obrigada!
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