CNV é sobre dar (expressar-se com honestidade) e
receber (receber com empatia). Nos últimos quatro capítulos, investigamos os 4
componentes que nos ajudam a expressar o que mais desejamos para enriquecer
nossa vida: observação, sentimento, necessidade
e pedido.
Agora, deixaremos de lado o expressar-se
para aplicar esses mesmos quatro componentes ao processo de prestar atenção no
que os outros estão observando, sentindo, precisando e pedindo,
mesmo que eles não saibam o que é CNV. Chamamos essa parte do processo de
comunicação de "receber com empatia".
Presença: não faça nada, apenas esteja lá.
“A empatia é a compreensão respeitosa do que os outros estão vivendo”
"Ouvir somente com os ouvidos é uma coisa.
Ouvir com o intelecto é outra. Mas ouvir com a alma não se limita a um único
sentido - o ouvido ou a mente, por exemplo. Portanto, ele exige o esvaziamento
de todos os sentidos. E, quando os sentidos estão vazios, então todo o ser
escuta. Então, ocorre uma compreensão direta do que está ali mesmo diante
de você que não pode nunca ser ouvida com os ouvidos ou compreendida com a
mente". Chuang-Tzu.
Para Marshall, a empatia na relação com o outro
ocorre somente quando conseguimos nos livrar de todas as ideias preconcebidas
e julgamentos a respeito deles. É preciso estar presente e essa
presença é muito difícil de conseguir. “Quase
um milagre”. Ele diz ao citar a escritora
francesa Simone Weil.
Isso acontece porque temos uma forte tendência de
dar conselhos, encorajar ou explicar nossa própria posição ou sentimento. Enquanto a empatia real está ali, demandando uma
concentração plena da nossa parte na mensagem da outra pessoa. É preciso dar a
ela tempo e espaço para que se sinta compreendida. Diz o provérbio budista:
"Não faça nada, só fique sentado".
É frustrante quando alguém precisa de empatia e a
gente assume que a pessoa precisa que “consertemos
a situação” através de conselhos ou
encorajamento. Isso tira de nós a presença necessária para que ela esvazie seu
coração e diminua seu sofrimento.
Alguns exemplos de obstáculos nos impedem de estar
presentes para nos conectar com empatia:
- Aconselhar: "Acho que você deveria ... ", "Por que é que você não fez assim?"
- Competir pelo sofrimento: "Isso não é nada; espere até ouvir o que aconteceu comigo".
- Educar: "Isso pode acabar sendo uma experiência muito positiva para você, se você apenas ..."
- Consolar: "Não foi sua culpa, você fez o melhor que pôde".
- Contar uma história: "Isso me lembra uma ocasião ..."
- Encerrar o assunto: "Anime-se. Não se sinta tão mal".
- Solidarizar-se: "Oh, coitadinho ... "
- Interrogar: "Quando foi que isso começou?"
- Explicar-se: "Eu teria telefonado, mas ... "
- Corrigir: "Não foi assim que aconteceu".
“O rabino Harold Kushner descreve quanto foi
doloroso para ele, quando seu filho estava morrendo, ouvir as palavras que as
pessoas ofereciam no intuito de fazê-lo sentir-se melhor. Ainda mais dolorosa
foi a constatação de que durante vinte anos ele estivera dizendo as mesmas
coisas a outras pessoas em situação semelhante”!
Não tem jeito, o ingrediente chave da empatia é a presença:
estar presente com aquilo que o outro está passando. Olhar de fora, observar e
propor teoria não é presença.
Compreensão mental e solidariedade também não. O
que não nos impede de escolher conscientemente algumas dessas coisas.
Procurando escutar sentimento e necessidades.
Na CNV, não importa que palavras as pessoas usem
para se expressar, não importa o que digam ou como digam, procuramos escutar
suas observações, sentimentos e necessidades, e o que elas estão pedindo
para enriquecer suas vidas.
O que tem por trás daquelas palavras? |
Se uma companheira de classe diz: “você não sabe trabalhar em grupo e só pensa em si
mesmo”. É provável que não saibamos da onde
vem a observação, mas podemos imaginar algum comportamento nosso que a levou a
dizer aquilo. Ao invés de receber aquilo como um ataque pessoal, podemos seguir
o diálogo tentando esclarecer qual necessidade dela não estamos atendendo e o que
ele gostaria de pedir para que saciemos essa necessidade.
Parafraseando
No capítulo 6, discutimos sobre a necessidade de
ter uma confirmação do nosso pedido e como pedir esse retorno. Agora,
analisaremos o como oferecer esse retorno utilizando um importante recurso. A
paráfrase.
“Se recebemos com precisão a mensagem da outra
pessoa, nossa paráfrase confirmará isso para ela. Por outro lado, se nossa
paráfrase estiver incorreta, a pessoa terá a oportunidade de corrigi-la. Outra
vantagem de escolhermos repetir a mensagem para a outra pessoa é que isso lhe
dá tempo para refletir no que disse e uma oportunidade de mergulhar mais
profundamente em si mesma”.
Ao invés de fazer perguntas frias, sem antes se
conectar com a realidade da pessoa, como:
- "Você está se referindo a qual atitude minha?"
- "Como você está se sentindo?" "Por que você está se sentindo assim?"
- "O que você quer que eu faça?"
Elas podem dar a impressão de que somos um
professor inquirindo-os ou um psicólogo em terapia.
Fazemos a paráfrase em formas de perguntas que
mostram nossa compreensão, permitindo que o outro faça qualquer correção
necessária de sua parte. As perguntas podem ser:
- O que os outros estão observando: "Você está reagindo à quantidade de noites em que estive fora na semana passada?"
- Como os outros estão se sentindo e quais as necessidades que estão gerando esses sentimentos: "Você está magoado porque gostaria de receber mais reconhecimento por seus esforços do que obteve?"
- O que os outros estão pedindo: "Você está querendo que eu exponha meus motivos para ter dito o que disse?"
Ao solicitar informações, também podemos primeiro
expressar nossos próprios sentimentos e necessidades: "Estou me sentindo frustrado porque gostaria
de ser mais claro a respeito daquilo a que você está se referindo. Você estaria
disposto a me dizer o que eu fiz para me ver dessa maneira?"
Marshall ainda esclarece:
“Como determinar se uma ocasião requer que
repitamos para as pessoas as mensagens que elas nos passam? Certamente, se não
temos certeza de que compreendemos a mensagem com exatidão, podemos usar uma
paráfrase para provocar uma correção do nosso palpite. Mas, mesmo que estejamos
confiantes de que compreendemos nosso interlocutor, podemos sentir que este
está esperando uma confirmação de que sua mensagem foi adequadamente recebida”.
Às vezes, sentimos que a pessoa está insegura
quanto ao recebimento da mensagem que ela emitiu. Ela pode perguntar se entendemos
ou se está claro. Quando isso acontece, a paráfrase é possivelmente
a melhor maneira de tranquilizar o emissor da mensagem de que a mensagem foi
recebida.
Entretanto, não há uma regra infalível na hora de
escolher parafrasear ou não, aqui vale sempre o bom senso e a intuição de cada
um. De modo geral, mensagens carregadas de sentimentos e
emoções fazem da paráfrase bem-vinda e
apreciada como forma de receber plenamente.
----
É preciso estar atento a possibilidade de a
paráfrase ser mal interpretada. Nossa intenção pode ser confundida como
manipulativa, do tipo: “não me venha com
essas técnicas”. Aqui, vale fazer uso da CNV mais
uma vez para reconhecer que não se trata de um ataque pessoal, mas sim de uma
expressão de necessidades. É uma oportunidade
de ajustar o nosso discurso.
Contudo, somos alertados:
“Se acontecer com frequência desconfiarem de nossas
motivações e de nossa sinceridade quando parafraseamos suas palavras, podemos
precisar examinar nossas próprias intenções mais de perto. Talvez estejamos
repetindo e acionando os recursos da CNV de maneira mecânica, sem manter uma
clara consciência de nosso propósito. Podemos nos perguntar, por
exemplo, se estamos mais empenhados em aplicar o processo ‘corretamente’ do que
em nos ligarmos ao ser humano à nossa frente. Ou talvez, mesmo que estejamos
usando a CNV em sua forma, nosso único interesse seja mudar o comportamento da
outra pessoa”.
Algumas pessoas resistem a paráfrase, alegando que
é uma perda de tempo. O que faz sentido dentro de um mundo que está cada vez
mais ansioso, atolado e apressado. Porém, esse é um pensamento limitado, uma
vez que não é capaz de enxergar os efeitos de médio-longo prazo de uma
comunicação bem-feita.
Uma economia de palavras no curto prazo pode nos
render alguns minutos em troca de uma infinidade de possíveis de mal-entendidos
que criam problemas extras e dificuldades às vezes muito maiores que o problema
original.
Mantendo a empatia
“Permanecendo em empatia, permitimos que nossos interlocutores atinjam níveis mais profundos de si mesmos”.
“Uma mensagem inicial é muitas vezes como a ponta
de um iceberg: ela pode ser seguida de sentimentos
ainda não expressos, mas relacionados - e, não raro, mais poderosos. Mantendo
nossa atenção concentrada no que está acontecendo dentro dos outros, oferecemos
a eles uma chance de explorar e expressar seu eu interior com profundidade.
Nós interromperíamos esse fluxo se desviássemos nossa atenção muito rapidamente
para seu pedido ou para nosso próprio desejo de nos expressarmos”.
Quando procedemos depressa demais para atender o
pedido do outro, podemos não transmitir interesse genuíno para com seus
sentimentos e necessidades. As pessoas podem pensar que estamos com pressa ou
querendo nos livrar delas rapidamente.
E quando saberemos o timing ideal? Duas evidências
são importantes para determinar que a pessoa que fala recebeu empatia
realmente: (a) há um alívio de tensão ou (b)
o fluxo de suas palavras chega ao fim.
Quando a dor bloqueia a nossa capacidade de oferecer empatia
A gente não pode oferecer aquilo que não tem.
“Se não temos a capacidade ou a disposição de oferecer empatia, apesar de nossos esforços, isso é geralmente um sinal de que estamos carentes demais de empatia para podermos oferecê-la aos outros”.
Precisamos de empatia para podermos oferecer
empatia.
Às vezes, precisamos recorrer a alguma empatia
emergencial de "primeiros socorros", prestando atenção no que está acontecendo
conosco, com a mesma qualidade de presença e atenção que oferecemos aos outros.
"Quanto mais fielmente você escutar a voz dentro de você, melhor escutará o que está acontecendo do lado de fora". Dag Hammarskjóld
Ainda assim, se isso não for possível. Podemos nos
retirar fisicamente do local e esperar até oferecer empatia seja possível
novamente.
Exercícios.
Você concorda com Marshall Rosenberg?
Diferencie receber com empatia do receber sem
empatia nos diálogos abaixo, em que a pessoa B está respondendo com empatia ao
que está acontecendo com a pessoa A.
- Pessoa A: Como eu pude fazer algo tão estúpido? Pessoa B: Ninguém é perfeito; você está sendo muito duro consigo mesmo.
- Pessoa A: Se você me perguntar, acho que devíamos mandar todos esses imigrantes de volta ao lugar de onde vieram. Pessoa B: Você realmente acha que isso resolveria alguma coisa?
- Pessoa A: Você não é Deus! Pessoa B: Você está se sentindo frustrado porque gostaria que eu admitisse que há outras maneiras de interpretar esse assunto?
- Pessoa A: Você acha muito natural que eu faça tudo para você. Fico imaginando o que você faria sem mim. Pessoa B: Isso não é verdade! Eu valorizo o que você faz por mim.
- Pessoa A: Como você pôde me dizer uma coisa dessas? Pessoa B: Você está magoado porque eu disse aquilo?
- Pessoa A: Estou furiosa com meu marido. Ele nunca está por perto quando preciso dele. Pessoa B: Você acha que ele deveria estar mais próximo do que costuma estar?
- Pessoa A: Detesto quando engordo. Pessoa B: Talvez fazer umas corridas ajudasse.
- Pessoa A: Estou uma pilha de nervos com o planejamento do casamento de minha filha. A família do noivo não está ajudando. Quase todos os dias eles mudam de ideia sobre que tipo de casamento querem. Pessoa B: Então você está nervosa com os preparativos e gostaria que a família do futuro genro tivesse mais consciência das complicações que a indecisão deles causa para você?
- Pessoa A: Quando meus parentes aparecem sem avisar com antecedência, sinto-me invadida. Isso me lembra como meus pais costumavam não levar em conta minhas necessidades e planejavam coisas para mim. Pessoa B: Sei como você se sente. Eu costumava me sentir assim também.
- Pessoa A: Estou decepcionado com seu desempenho. Eu queria que seu departamento tivesse dobrado sua produção no mês passado. Pessoa B: Compreendo que você esteja decepcionado, mas tivemos muitas faltas por motivo de doença.
Respostas:
- Não circulei esse número, porque entendo a pessoa B oferecendo encorajamento, e não recebendo com empatia o que a pessoa A está expressando.
- Vejo a pessoa B tentando educar a pessoa A, em vez de receber com empatia o que esta está expressando.
- Se você circulou esse número, concordamos. Vejo a pessoa B recebendo com empatia o que a pessoa A está expressando.
- Vejo a pessoa B discordando e se defendendo, e não recebendo com empatia o que está acontecendo com a pessoa A.
- Vejo a pessoa B assumindo a responsabilidade pelos sentimentos da pessoa A, e não recebendo com empatia o que está acontecendo com esta. A pessoa B poderia ter dito: "Você está magoado porque queria que eu tivesse concordado em fazer o que você me pediu?"
- Se você circulou esse número, concordamos em parte. Vejo a pessoa B receptiva aos pensamentos da pessoa A. No entanto, acredito que nos conectamos mais profundamente quando recebemos os sentimentos e necessidades que estão sendo expressos em vez dos pensamentos. Assim, eu teria preferido que a pessoa B tivesse dito: "Então você está furiosa porque gostaria que ele estivesse por perto mais vezes do que costuma estar?"
- Vejo a pessoa B aconselhando a pessoa A, e não recebendo com empatia o que está acontecendo com ela.
- Se você circundou esse número, estamos de acordo. Vejo a pessoa B recebendo com empatia o que a pessoa A está expressando.
- Em minha opinião, a pessoa B presumiu que compreendeu o que a pessoa A disse e está falando sobre seus próprios sentimentos. Ela não está recebendo com empatia o que está acontecendo com a pessoa A.
- Vejo que a pessoa B começa a se concentrar nos sentimentos da pessoa A, mas em seguida passa a se explicar.
Até o próximo capítulo!
Nenhum comentário:
Postar um comentário