Quando o uso da força é inevitável
Quando duas partes em
conflito tiverem a oportunidade de expressar plenamente o que estão observando,
sentindo, precisando e pedindo, é provável que se chegue em uma solução que
atenda ambas.
No entanto, existem
situações em que um diálogo desses não é possível, o uso da força pode ser
necessário para proteger a vida ou os direitos individuais.
A outra parte pode não
estar disposta a dialogar ou pode não haver tempo hábil para tal.
Nesses momentos, a CNV pede
que diferenciemos o uso protetor e o uso punitivo da força.
O pensamento por trás do uso da força
A intenção por trás dos
nossos atos é uma ideia presente ao longo de toda a teoria da CNV e aqui ele se
faz ainda mais importante.
É preciso que tenhamos, ao
aplicar o uso da força, a clara intenção de evitar danos ou injustiças. Quando
se usa força
punitiva, a intenção
é fazer que as pessoas sofram por seus atos então percebido como inadequados.
“Quando
agarramos uma criança que está correndo na rua para impedir que ela se
machuque, estamos aplicando a força protetora. O uso da força punitiva, por outro lado, poderia
envolver um ataque físico ou psicológico, como espancar a criança ou dar-lhe
uma reprimenda como: ‘Como você pôde ser tão estúpida? Você deveria ter
vergonha de si mesma’!”
A força
protetiva se concentra na vida ou nos direitos que se deseja proteger, sem
julgar a pessoa ou o seu comportamento. Não se condena a criança que correu na rua, nosso
pensamento deve ser dirigido a protegê-la.
A premissa do uso protetor
da força é que algumas pessoas se comportam de maneira prejudicial ao ambiente,
devido a algum tipo de ignorância, que inclui:
- falta de consciência das consequências de nossas ações;
- incapacidade de perceber como nossas necessidades podem ser atendidas sem prejudicar os outros;
- crença de que temos o "direito" de punir ou ferir os outros porque eles "merecem"; e
- pensamentos delirantes que envolvem, por exemplo, ouvir uma "voz" que nos instrui a matar alguém.
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Já as ações punitivas,
baseiam-se na premissa que as pessoas fazem coisas ruins porque são más, e de
que para corrigir a situação, é preciso fazer que elas se arrependem.
- sofram o bastante a ponto de perceberem que suas ações são inadequadas;
- arrependam-se; e
- mudem.
Tipos de força punitiva
O castigo físico como bater
em pessoas é um exemplo de força punitiva. Esse é um assunto delicado, que
desperta fortes sentimentos entre pensamentos opostos.
Para alguns pais, bater em
algumas crianças demonstra que amamos porque estabelece limites claros. É comum
dizerem que “têm de” usar a força punitiva,
porque não enxergam outra maneira de mostrar aos filhos o que é bom pra eles.
Educar um filho é um
desafio. Mantê-lo em segurança ao mesmo tempo que desenvolver sua autonomia é
uma dualidade controversa e um equilíbrio impecável. É interessante procurarmos
enxergar todas as tentativas de educação e suas dificuldades com empatia.
Contudo, pais que defendem
o sucesso da criação de seus filhos através da punição talvez não tenham
consciência de:
- inúmeros casos de crianças que se voltam contra o que poderia ser bom pra elas, simplesmente por escolherem lutar contra a coerção. Uma vez que, a coerção invade a necessidade humana universal de ter escolhas;
- que outros métodos também poderiam funcionar igualmente bem; e
- as consequências sociais de se empregar o castigo físico.
“Quando os
pais escolhem usar a força, podem ganhar a batalha de obrigar as crianças a
fazer o que eles querem, mas, nesse processo, não estarão perpetuando uma norma
social que justifica a violência como meio de resolver diferenças”?
Uma norma social alienante
e superficial.
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Outra forma de força
punitiva é a retirada de alguns meios de gratificação, como cortar mesada,
proibir o videogame ou retirar a permissão para sair.
É uma punição que deixa
clara como ameaça a retirada da afeição ou do respeito por parte dos pais.
Os custos da punição
O capítulo 9 nos lembra
muito bem e aqui Marshall reforça mais uma vez:
“Quando nos
submetemos a fazer alguma coisa apenas com o propósito de evitar uma punição,
nossa atenção é desviada do valor da própria ação. Em vez disso, estamos nos concentrando
nas consequências que podem acontecer se deixarmos de agir daquela maneira”.
Se você trabalha pelo medo
da punição ou qualquer outro motivo que não seja o valor de seu trabalho, é
provável que seu desempenho diminuíra, levando também a sua autoestima.
“Se as crianças escovam os dentes porque sentem vergonha e medo do ridículo, sua saúde bucal pode melhorar, mas seu respeito por si mesmas ganhará cáries”.
Quanto mais formos vistos
como agentes da punição, mais difícil será para os outros responderem
compassivamente a nossas necessidades.
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Temos aqui uma ilustração
perfeita do quão grande é alienação perpetuada
pela punição como método corretivo:
“Eu estava visitando um amigo, diretor de escola,
em seu escritório, quando ele percebeu pela janela um menino grande batendo em
outro menor. ‘Com licença’, ele disse, saltou e correu para o pátio. Agarrando o aluno maior, ele
lhe deu um tapa e o repreendeu: ‘Isso lhe ensinará a não
bater em pessoas menores!" Quando o diretor voltou
para dentro, observei: ‘Não acho que você tenha
ensinado àquela criança o que você pensou que estava ensinando. Suspeito que,
em vez disso, o que você lhe ensinou foi a não bater em pessoas menores do que
ele quando alguém maior - como o diretor - pode estar olhando!
Se você fez alguma coisa, parece-me que foi
reforçar a noção de que a maneira de obter o que você quer de alguém é batendo
nessa pessoa’”.
Duas perguntas que revelam as limitações da punição
Duas perguntas nos ajudam a enxerga por que é improvável que obtenhamos o que queremos se usarmos a punição para mudar o comportamento das pessoas.
1) O que eu quero que essa pessoa faça que seja diferente do que ela está fazendo agora?
Essa pergunta é até mais
comum. Com ela a punição pode parecer eficaz, porque a ameaça ou a força
punitiva podem ser muito bem influenciadores do comportamento.
2) Quais quero que sejam as razões dessa pessoa para fazer o que estou pedindo?
Raramente paramos pra
pensar nessa pergunta. Quando a consideramos, percebemos então que a punição e
a recompensa interferem e afastam as pessoas a fazerem as coisas pelos motivos
que gostaríamos realmente.
É decisivo termos
consciência da importância das razões das pessoas para se comportarem como
pedimos.
“A CNV estimula um nível de desenvolvimento ético baseado na autonomia e na interdependência, pelo qual reconhecemos a responsabilidade por nossas próprias ações e temos consciência de que nosso próprio bem-estar e o dos outros são uma coisa só”.
Até o próximo capítulo!
Puxa, Lucas... que bom vê-lo de volta ao trabalho de resenhar os capítulos do livro da CNV... já estava com saudades.
ResponderExcluirE esse capítulo tem uma profundidade conceitual muito grande - e acho que você conseguiu passar bem estes conceitos. Muito grato! Vou utilizar seu belo trabalho em grupos de estudos sobre a postura e filosofia de vida CNV. Um abração! Sérgio - Franca , SP.
Em tempo: Espero que consiga logo, logo resenhar os dois capítulos que faltam... Aí é só estourar a champagne para comemorar !!!! :)
ResponderExcluirFala Sérgio! Fico muito feliz com sua companhia por aqui! E que ótimo que está sendo útil pra você. Me alegra e motiva demais! E obrigado por não desistir de mim! Em breve vamos terminar essas resenhas, e aí é como você falou: celebrar muito!!
ResponderExcluirGrande abraço!
Parabéns!
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